Fundanews

Como tornar as metodologias ativas eficazes para jovens e adultos

Written by Redação | Jun 14, 2024 1:38:22 PM

Como, de fato, aprendemos? Quando a aprendizagem é efetiva? Pode o aprendizado ser divertido ou ele é sempre entediante? Estas perguntas deveriam ser base para reflexão de todo o professor.

Héctor Ruiz Martín, um pesquisador e autor especializado em neurociência e psicologia cognitiva, focado principalmente na memória e no aprendizado, defende a ideia de que o aprendizado significativo vai além da mera memorização de fatos; é necessário compreender e aplicar os conceitos aprendidos. Ele destaca a importância da motivação e do ambiente de sala de aula para promover um aprendizado eficaz. Tem um exemplo, citado por ele, que acho fantástico, ilustrando quando um aprendizado se efetiva. 

A reflexão é a seguinte: se eu perguntar a você se seria capaz de desenhar uma nota de R$ 10,00, o que você diria? 

A maioria das pessoas já viu uma nota de 10 reais milhares de vezes, mas não são capazes de desenhar mais de dois ou três detalhes dela corretamente. Sabe por quê? Talvez esta também seja a sua resposta: “Já vi centenas de vezes, mas não prestei atenção”. Ou seja, prestar atenção significa que não pensamos a respeito dela. Por exemplo, se analisarmos os componentes da nota, os elementos, as cores, os traços, o que está escrito e fizermos relações com as outras notas, ou notas anteriores, a chance de sabermos mais a respeito da nota de R$ 10,00 é muito maior. 

Isso significa que pensar sobre algo em termos de seu significado implica vincular a nova informação aos nossos conhecimentos prévios. Aprendemos quando ativamos os conhecimentos prévios relevantes e os conectamos com o objeto de aprendizagem.  Quanto mais conexões fizermos, mais forte será o aprendizado, e mais fácil será recuperá-lo quando necessário, pois mais contextos diferentes o ativarão.

Um outro ponto, que você já deve saber, é que a forma como os adultos aprendem é diferente das crianças. As capacidades mentais de crianças e adultos são diferentes. Na pedagogia, a criança depende muito mais do conhecimento proposto pelo professor. Já na andragogia, o adulto interessa-se pelo como fazer. Por isso, costumamos tratar a pedagogia – “paidos”, que significa criança, e “agogos”, que significa conduzir ou guiar como a arte ou ciência de guiar, liderar ou conduzir crianças. A palavra “andragogia” também tem suas raízes no grego “andros”, que significa homem ou adulto e “agogos”, que igualmente significa conduzir, liderar ou guiar. Assim, andragogia etimologicamente significa a arte ou ciência de guiar ou conduzir adultos.

Malcolm Knowes é um dos maiores influenciadores da andragogia e seus estudos são pilares para o trabalho da educação de adultos.

Veja o detalhamento de cada um destes princípios e como se aplicam na sala de aula:

  • Necessidade de saber: para os alunos adultos, é fundamental que saibam o “porquê” daquilo que estão aprendendo. Também precisam reconhecer  “por quê” este princípio é importante para sua vida. Logo, é fundamental que o adulto entenda “como” poderá aplicar novos conhecimentos. Neste sentido, quando o professor traz um problema em que faz o estudante se identificar com ele, mostrando como a aula ou aquele conteúdo apoiará na superação do desafio, terá mais chances de conseguir a motivação dos estudantes. 
  • Autoconceito: o adulto é autodirigido, significa que ele assume um papel mais ativo durante a sua formação. Ele atravessou a ponte da aprendizagem dependente para uma aprendizagem independente. Reconhecer esta autonomia e independência é fundamental para promover maior participação dos estudantes na tomada de decisões.
  • Experiência: os aprendizes adultos colecionam uma grande quantidade de experiências, inclusive erros que são fontes valiosas de informação e apoio para novas aprendizagens. Reconhecer sua identidade, sua experiência de vida, sua carreira como parte da nova jornada de aprender é imprescindível. Neste sentido, quando o professor conhece seus estudantes, consegue apoiá-los no processo de desenvolvimento, conectando novos saberes com suas experiências anteriores. 
  • Prontidão: a disposição para o aprendizado precisa se conectar também com os desafios diários. Considerar sua jornada de trabalho ou rotinas familiares além de aprendizagens que o ajudarão a enfrentar os desafios do dia a dia.  
  • Orientação: o foco está em resolver problemas e encontrar soluções práticas. Ambientes de aprendizagem envolventes consideram desenvolver competências reais que possam ajudar os estudantes nas suas carreiras atuais. 
  • Motivação: refere-se à motivação intrínseca, promover o reconhecimento do sucesso do estudante, favorecendo o aumento da autoestima e da confiança. Diferentemente das crianças, nessa fase, o aprendizado também é autorrealização, e os adultos valorizam isso.

Quando comparamos as contribuições de Malcolm Knowles e Paulo Freire, vemos que ambas reconhecem o educando adulto como ser independente, com ênfase na autonomia. Consideram a experiência do educando como um recurso valioso para a aprendizagem, utilizando métodos ativos e da valorização da participação do estudante. Contudo, Paulo Freire vai além, focando no empoderamento do educando através da “cultura da palavra”, contrapondo-se à “cultura do silêncio”, promovendo uma abordagem pedagógica crítica e emancipatória.

Freire reconhece o direito dos educandos de partir de uma atitude curiosa, da sua história e do mundo para se envolverem gradualmente numa análise crítica da realidade. Além disso, diferente de Knowles, que concentra sua visão do indivíduo em termos psicológicos, Freire vai além, incorporando os contextos sociais, políticos, culturais, econômicos e históricos no trabalho educacional. 

Assim, para Paulo Freire, a educação adulta é uma prática da liberdade, que promove a autonomia e a capacidade dos indivíduos de questionar e transformar sua realidade. O diálogo é central, com educadores e educandos aprendendo e ensinando mutuamente. A conscientização desenvolve uma compreensão crítica das condições socioeconômicas e políticas, capacitando ações transformadoras. 

Freire valorizava o saber prévio dos educandos, contextualizando a aprendizagem em seus contextos culturais, sociais e históricos, e encorajava a participação ativa no processo educativo. A educação problematizadora, em contraste com a abordagem bancária, incentiva a reflexão sobre problemas reais. A humanização e a transformação social são objetivos centrais, com a educação promovendo justiça social e igualdade, criando um ambiente democrático e transformador em que o aprendizado é uma construção coletiva de conhecimento e emancipação.

Na sala de aula

Agora, vamos tentar colocar tudo isso em prática? Conectar as metodologias ativas favorecendo o aprendizado efetivo dos jovens e adultos pressupõe que nós, professores, definamos metas e objetivos claros e que nossas intenções pedagógicas sejam partilhadas com eles, fortalecendo seu propósito com a aprendizagem. 

Enquanto gestores, podemos promover reflexões permanentes sobre nossos currículos, adequando as expectativas dos estudantes e motivando-os a se envolver no  processo de aprendizagem.

Além disso, podemos encorajar nossos alunos a investigar para além dos limites das bordas curriculares, fomentando sua capacidade curiosa e criativa de se conectar com novos saberes.  

Uma das formas é apoiar os estudantes a criarem seu próprio processo de aprendizagem ou aprender de maneira autodirigida. Significa assumir a autoria do seu próprio processo, ser protagonista no aprender, independentemente se você está em um ambiente formal ou não formal. 

Para conseguir fazer isso, no entanto, é fundamental ajudar os estudantes a reconhecer suas próprias crenças sobre o aprender, tais como: só é possível aprender em ambientes formais e com apoio de alguém, que aprender é sinônimo de conteúdo, que é um mal necessário, que é solitário. Romper com a ideia, por exemplo, de que o professor educa e os alunos são educados, o professor dá e o estudante recebe. 

Superada esta etapa, é possível reconhecer a aprendizagem autodirigida como um ato que envolve vontade e intencionalidade. Criar uma cultura de aprendizagem autodirigida pode começar na escola e na universidade e se expandir para ambientes organizacionais e para a vida. Se aprender será nossa maior necessidade, para nos adaptarmos às mudanças velozes que estamos vivendo, como nós, professores, podemos ajudar os estudantes a desenvolver a capacidade de se autodirigir no aprendizado? 

Podemos fomentar a aprendizagem autodirigida incentivando a autonomia e o pensamento crítico dos estudantes. Isso pode ser alcançado ao promover a definição de metas pessoais, o planejamento e a priorização de tarefas, e a reflexão contínua através de diários de aprendizagem e autoavaliação. Além disso, é essencial fornecer acesso a uma variedade de recursos e tecnologias educacionais e criar um ambiente de apoio por meio de comunidades de aprendizagem colaborativa. Exemplificar comportamentos autodirigidos e compartilhar estratégias pessoais de estudo também são práticas inspiradoras. Os alunos se tornam mais independentes, confiantes e preparados para a aprendizagem contínua ao longo da vida.

Fonte: Revista Ensino Superior