A taxa de inadimplência, isto é, o não cumprimento das obrigações financeiras do aluno com a instituição de ensino, no setor de ensino superior privado brasileiro chegou a 9,33% no primeiro semestre de 2024, um aumento de 3,4% em relação ao mesmo período de 2023. Os dados são da 16ª edição da Pesquisa de Inadimplência no Ensino Superior Privado, desenvolvida pelo Instituto Semesp, em parceria com a Principia.
O estudo também revelou variações significativas conforme o porte das instituições. Enquanto as de pequeno porte registraram uma leve queda de 0,7% nos créditos não recebidos, as instituições de médio e grande porte observaram aumentos de 10,3% e 4,7%, respectivamente. Apesar da queda leve, a inadimplência nas pequenas instituições continua mais alta, atingindo 14,26%, em comparação com 7,91% nas médias e 9,15% nas grandes, sugerindo que essas instituições enfrentam maiores dificuldades para lidar com a inadimplência.
“Os alunos dessas instituições geralmente têm renda menor e menos acesso a crédito, o que torna o desafio da inadimplência ainda maior para as IES de pequeno porte”, explica Rodrigo Capelato, economista e diretor executivo do Semesp, entidade que representa mantenedoras de ensino superior no Brasil. A pesquisa, que reúne 250 instituições de ensino que representam cerca de 26% das matrículas do país em cursos presenciais e a distância (EaD), oferece um panorama sobre o impacto econômico por porte das instituições e as variações por modalidade de ensino.
Após um aumento acentuado na inadimplência em 2020, impulsionado pela pandemia e seus efeitos econômicos, o setor privado de ensino superior enfrentou grandes desafios. A crise elevou o desemprego, reduziu a renda e restringiu o crédito estudantil, resultando na elevação da inadimplência. Já em 2022, houve uma leve queda, indicando uma possível recuperação financeira dos estudantes, mas essa melhora foi breve: em 2023, a taxa de inadimplência (atrasos acima de 90 dias) voltou a crescer, alcançando 9,03%.
No primeiro semestre de 2024, os atrasos nas mensalidades de cursos presenciais voltaram a aumentar 3%, o que confirma uma pressão contínua sobre os alunos e suas famílias. O cenário foi mais crítico no EaD, onde a inadimplência (atrasos acima de 30 dias) subiu 11,8%, elevando a taxa total no setor de ensino superior privado a 9,33%, um aumento de 3,4% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Para Capelato, o cenário macroeconômico também influencia a inadimplência do setor. A inflação, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), foi de 4,62% em 2023, impactando o poder de compra das famílias e o orçamento das instituições, que precisam equilibrar custos crescentes. Dados do Serasa de agosto deste ano mostram que 47,9% da renda das famílias está comprometida com dívidas, enquanto 26,8% da renda mensal está destinada ao pagamento de parcelas e juros. “Esses números acendem um sinal de alerta para o ensino superior privado”, diz Capelato.
“Apesar da redução no desemprego, as vagas criadas oferecem salários insuficientes para cobrir esse aumento dos compromissos financeiros, especialmente com as mensalidades escolares que são as primeiras a serem postergadas”, explica o diretor do Semesp. “Esse cenário de comprometimento de renda continuará a desafiar o setor, principalmente no ensino presencial, onde as mensalidades são mais altas”, completa.
Ele também destaca que o setor educacional tem uma taxa de inadimplência elevada em relação a outros setores da economia, e que a Lei das Mensalidades impede as IES de suspender os serviços para alunos inadimplentes, contribuindo para esse índice. Além disso, ele apontou diferenças no perfil dos alunos: enquanto os cursos presenciais atraem estudantes mais jovens, o EaD conta com alunos mais velhos, já inseridos no mercado de trabalho. “Com o crescimento das matrículas no EaD, onde as mensalidades são mais acessíveis, precisamos analisar essa questão com uma nova perspectiva”, defende.
Mesmo com a queda do índice de desemprego, o cenário permanece desafiador, com a inflação afetando a renda do trabalhador e os salários baixos comprometendo a capacidade de pagamento. “Outro fator que tem contribuído para o endividamento e impactado o orçamento dos estudantes são as apostas online. Com base ainda em dados preliminares, aparentemente os Bets surgem como uma nova concorrência para o setor”, conclui Capelato.
Fonte Correio Braziliense